Queda De Pelo Em Gatos Como Identificar E Tratar Antes Que Piorar
A queda de pelo em gatos é uma manifestação clínica comum que pode indicar diversas condições dermatológicas ou sistêmicas subjacentes, exigindo uma abordagem clínica minuciosa para o diagnóstico preciso e tratamento adequado. Essa perda anormal de pelagem não se resume a aspectos estéticos, mas reflete um desequilíbrio no sistema cutâneo e possivelmente de órgãos internos, impactando diretamente o bem-estar e a qualidade de vida do animal. Como médico veterinário especialista em dermatologia felina, é essencial compreender os múltiplos fatores envolvidos nessa condição para oferecer um manejo eficaz que assegure a saúde plena do gato.
Aspectos fisiológicos e patológicos da queda de pelo em gatos
Antes de analisar as causas específicas, é importante entender o ciclo natural do pelo felino e as mudanças fisiológicas que podem ocorrer.
Ciclo do pelo em felinos: anágeno, catágeno e telógeno
O pelo do gato passa por três fases distintas: anágeno (fase de crescimento), catágeno (fase de transição) e telógeno (fase de repouso). Em condições normais, a queda ocorre no final da fase telógena de forma controlada e com substituição contínua dos fios.
Alterações nesse ciclo, como um aumento anormal da fase telógena ou interrupção da fase anágena, resultam em alopecia patológica, evidenciando a queda de pelo como sinal clínico. Essa compreensão é fundamental para diferenciar a queda fisiológica da patológica.
Fatores predisponentes fisiológicos e ambientais
Fatores como idade, estresse, variações sazonais e mudanças hormonais (ex: estro, castração) podem influenciar o ciclo piloso e desencadear queda temporária de pelo. Apesar disso, despedidas excessivas associadas à lesões ou prurido indicam uma alteração anatômica ou metabólica que necessita investigação.
Com esse contexto fisiológico, é possível avançar para as causas clínicas que acometem os gatos, pois a perda anormal de pelo não é uma doença em si, mas um sinal clínico cuja etiologia deve ser cuidadosamente individualizada.
Causas clínicas da queda de pelo em gatos
A queda anormal de pelo nas diferentes regiões do corpo pode ser desencadeada por uma gama complexa de causas, desde parasitárias até hormonais, exigindo uma análise detalhada do histórico e do exame clínico dermatológico.
Dermatopatias parasitárias
Infestação por parasitas ectoparasitários é uma das causas mais frequentes de queda de pelo felina, especialmente em gatos que têm acesso externo.
- Ácaros: Infestações por Otodectes cynotis (ácaro da orelha), Demodex cati e Demodex gatoi podem causar queda de pelo associada a prurido intenso e lesões eritematosas, descamação e crostas.
- Sarna sarcóptica: Embora rara, a sarna causada por Sarcoptes scabiei provoca intensa prurido, alopecia e lesões exsudativas, principalmente nas pinças nasais, orelhas, cotovelos e patas dianteiras.
- Pulgas: A infestação por Ctenocephalides felis induz prurido e pode desencadear alopecia por auto-trauma e dermatite alérgica à saliva da pulga (DAFP).
O diagnóstico desses parasitas baseia-se na raspagem cutânea, exame microscópico, tricograma e, ocasionalmente, citologia.

Dermatites alérgicas: identificação e manejo
As dermatites alérgicas são causas comuns e complexas de queda de pelo em gatos. A manifestação clínica inclui prurido variável e alopecia resultante do excesso de lambedura e automutilação.
- Dermatite alérgica à pulga (DAFP) – É a alergia mais prevalente, caracterizada por hiperemia, pápulas, crostas e alopecia em regiões lombossacral e base da cauda.
- Dermatite atópica – Embora menos comum em gatos do que em cães, a alergia ambiental pode ocasionar prurido generalizado e queda de pelo.
- Alimentar – Reação a proteínas ou aditivos da dieta que se manifestam com alopecia simétrica e prurido, requerendo exames e dietas de exclusão para diagnóstico.
O tratamento envolve manejo antiparasitário rigoroso, controle ambiental, uso criterioso de anti-inflamatórios (corticosteroides, ciclosporina) e ajustes dietéticos para alergias alimentares, sempre com acompanhamento veterinário contínuo.
Infecções cutâneas secundárias
Infecções bacterianas, principalmente por Staphylococcus spp., e fúngicas, notadamente por Malassezia pachydermatis e dermatófitos como Microsporum canis, são causas relativamente comuns e costumam se desenvolver em áreas já comprometidas por outras dermatopatias.
Essas infecções agravam a queda de pelo ao provocar inflamação local, prurido e irritação, e são diagnosticadas por citologia, cultura e exame micológico. Seu controle é fundamental na recuperação do pelo e da pele.
Distúrbios hormonais e metabólicos
Alterações endócrinas estão entre as causas mais desafiadoras da queda de pelo em gatos, muitas vezes com apresentação clínica sutil e progressiva:
- Hipertireoidismo – Doença frequente em gatos idosos que pode causar queda de pelo difusa e pele fina.
- Hipoadrenocorticismo e hipertireoidismo – Afetam o eixo hormonal, resultando em alopecia, fraqueza e alterações metabólicas.
- Diabetes mellitus – Favorece infecções cutâneas secundárias e alopecia pela desnutrição celular da pele.
O diagnóstico requer exames laboratoriais complementares, como dosagens hormonais e avaliações bioquímicas, enquanto o tratamento envolve estabilização clínica e correção dos distúrbios.
Causas comportamentais e psicogênicas
O estresse ambiental, ansiedade e maus manejos podem induzir banho excessivo e lambedura compulsiva, resultando em alopecia psicogênica. Essa condição demanda diagnóstico diferencial rigoroso para excluir causas orgânicas e implementar medidas comportamentais e farmacológicas.
Neoplasias e condições raras
Neoplasias cutâneas ou sistêmicas podem se apresentar com lesões que incluem queda de pelo localizada ou generalizada. Além disso, doenças raras como alopecia psicogênica por causa neurológica e deficiências nutricionais severas também podem contribuir para o quadro.
Continuando, examinaremos como conduzir uma avaliação clínica detalhada para diagnosticar adequadamente as causas da queda de pelo em gatos.
Diagnóstico clínico da queda de pelo em gatos
A queda de pelo tem múltiplas etiologias, tornando o diagnóstico clínico um processo criterioso que envolve história clínica detalhada, exame dermatológico completo e exames complementares direcionados.
Coleta do histórico clínico e ambiental
É fundamental identificar o início, a progressão, a localização da alopecia, hábitos comportamentais, exposição a outros animais, acesso ao ambiente externo, dieta, medicações e vacinação. Perguntas detalhadas sobre prurido, lesões associadas e tratamentos prévios ajudam a orientar hipóteses diagnósticas.
Exame dermatológico: inspeção e palpação
Inspecionar todas as áreas de pelagem, focando em sinais como eritema, escoriações, crostas, descamação, alterações ungueais e presença de parasitas visíveis. A palpação identifica espessamento ou induração da pele. O padrão da alopecia (simétrica, localizada, difusa) e a presença de prurido são elementos essenciais.
Exames complementares específicos
- Raspado cutâneo – Identificação de ácaros como Demodex e Sarcoptes.
- Tricograma – Avaliação do estado dos pelos e presença de parasitas.
- Citologia cutânea – Detecta células inflamatórias, bactérias e leveduras.
- Cultura fúngica – Diagnóstico de dermatófitos quando suspeita de micose.
- Exames laboratoriais gerais – Hemograma, perfil bioquímico e exames hormonais para avaliação sistêmica.
- Teste de alergia intradérmica e sorológico – Caso suspeita por dermatite atópica ou alimentar.
- Biópsia cutânea – Em casos refratários ou atípicos para diagnóstico histopatológico preciso.
O exame sistemático e o uso adequado dessas ferramentas garantem um diagnóstico diferencial preciso, refletindo diretamente na escolha do tratamento mais eficaz e seguro para o gato.
Tratamento eficiente da queda de pelo em gatos
O protocolo terapêutico para alopecia deve ser individualizado, considerando a causa identificada, as condições gerais do animal e o potencial efeito adverso dos medicamentos.
Controle e erradicação de parasitas
Medicações tópicas e sistêmicas, como fipronil, selamectina e imidacloprida, são eficazes contra pulgas e ácaros, sendo indispensável tratar todos os animais do ambiente para evitar reinfestações. O tratamento deve ser mantido por pelo menos quatro semanas para assegurar eliminação completa do parasita e retomada do ciclo de crescimento capilar.

Tratamento das dermatites alérgicas
Inclui restrição rigorosa das exposições às causas identificadas (ex: controle ambiental para alergias atópicas, dieta hipoalergênica para alergia alimentar), além do uso de anti-inflamatórios sistêmicos ou tópicos controlados, como corticosteroides em doses seguras e ciclosporina. O manejo da DAFP requer antipulgas eficaz e prevenção ambiental contínua.
Antimicrobianos e antifúngicos para infecções secundárias
Quando há infecção bacteriana secundária, usa-se antibióticos específicos com base em cultura e antibiograma para evitar resistência. Em infecções fúngicas, antifúngicos tópicos e/ou sistêmicos como itraconazol e griseofulvina são indicados, respeitando o tempo necessário para o tratamento completo.
Abordagem dos distúrbios hormonais
Uma vez diagnosticado o distúrbio endocrinológico, é imprescindível tratá-lo com reposição ou supressão hormonal específica, monitorando a resposta ao longo do tempo. O controle metabólico favorece a recuperação da pelagem e da saúde geral do gato.
Apoio nutricional e manejo comportamental
Suplementos nutricionais que favorecem a saúde da pele, como ácidos graxos essenciais, podem ser indicados, junto a higiene adequada e enriquecimento ambiental para minimizar estresse comportamental. Em casos de alopecia psicogênica, o tratamento pode incluir moduladores comportamentais e terapia farmacológica sob supervisão veterinária.
Prevenção da queda de pelo e promoção do bem-estar cutâneo felino
Prevenir a queda anormal de pelo em gatos requer uma abordagem integrada que envolve cuidados diários, controle dos fatores predisponentes e vigilância constante das alterações cutâneas.
Cuidados gerais com a pelagem e higiene
Escovações regulares ajudam a remover pelos soltos e estimulam a circulação local, além de permitir a detecção precoce de lesões. Banhos esporádicos e recomendados com shampoos específicos mantêm o equilíbrio da flora cutânea e evitam ressecamento da pele.
Controle de parasitas e ambiente saudável
Aplicar protocolos antiparasitários preventivos, sobretudo em gatos com acesso externo, é imprescindível para evitar infestações que causam queda de pelo. Limpeza ambiental frequente e manejo adequado dos locais de descanso evitam o ciclo dos parasitas.
Alimentação balanceada e suplementação
Dieta completa e de alta qualidade, rica em proteínas e nutrientes essenciais, é a base para a saúde cutânea. Suplementos como ômega-3 e vitaminas do complexo B podem ser indicados para otimizar a recuperação da pelagem e a função imunológica.
Monitoramento frequente e acompanhamento veterinário
Observar regularmente pequenas alterações na pelagem, comportamento e pele pode antecipar intervenções. Consultas veterinárias anuais, ou conforme orientação para casos crônicos, garantem ajustes terapêuticos e acompanhamento da saúde dermatológica.
Finalmente, é essencial que os tutores entendam a importância do diagnóstico precoce e tratamento adequado para evitar o sofrimento do gato e complicações futuras, mantendo a pelagem saudável e o equilíbrio cutâneo.
Considerações finais: abordagem clínica, cuidados e próximos passos
A queda de pelo em gatos reflete um sinal clínico de inúmeras condições, desde causas simples e reversíveis até doenças complexas que demandam intervenções especializadas. O manejo veterinário eficaz inicia pela identificação detalhada do padrão da alopecia e dos sintomas associados, seguido de diagnóstico laboratorial específico para confirmar o agente causal.
É imprescindível que o tutor observe e relate detalhadamente o histórico, incluindo local, duração, hábitos do gato e possíveis mudanças no ambiente ou dieta. Ao notar queda anormal de pelo, especialmente se associada a prurido, lesões, ou alteração de comportamento, o ideal é buscar avaliação veterinária especializada o quanto antes.
Durante o acompanhamento domiciliar, recomenda-se monitorar a evolução da pelagem, a presença de novos sintomas e o comportamento do animal em relação à higiene e lambedura. A manutenção dos tratamentos prescritos, controle ambiental e cuidados nutricionais são pilares para o sucesso a longo prazo.
Em suma, a queda de pelo não deve ser negligenciada, pois prejudica o conforto do gato e pode mascarar doenças subjacentes graves. A combinação de diagnóstico preciso, tratamento direcionado e prevenção efetiva assegura a saúde dermatológica e o bem-estar integral do seu gato, refletindo a responsabilidade e o carinho que todo tutor deve oferecer.