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julho 7, 2025

Função renal em gatos geriátricos: avaliação clínica e laboratorial avançada

Função renal em gatos geriátricos: avaliação clínica e laboratorial avançada

A função renal em gatos geriátricos representa um aspecto crucial para o manejo clínico e para o diagnóstico laboratorial de doenças crônicas e agudas concomitantes. Com o avanço da idade, a nefropatia crônica é altamente prevalente, representando uma das principais causas de morbidade e mortalidade em felinos idosos. Portanto, a avaliação da função renal envolve integralmente aspectos fisiopatológicos, bioquímicos e laboratoriais que fornecem dados essenciais para o diagnóstico precoce, estadiamento e monitoramento terapêutico da Doença Renal Crônica (DRC) e demais condições associadas.

Fisiologia renal e alterações fisiopatológicas associadas ao envelhecimento em gatos

O rim felino possui funções complexas de filtração, reabsorção, secreção e excreção que garantem o equilíbrio ácido-base, a homeostase eletrolítica e a excreção de metabólitos nitrogenados. Em gatos geriátricos, a redução progressiva da taxa de filtração glomerular (TFG) ocorre devido à esclerose glomerular, fibrose intersticial e perda do número de néfrons funcionantes.

Alterações estruturais renais associadas à senescência

A senescência renal é caracterizada por fibroesclerose glomerular e tubular, presença de atrofia tubular e um aumento relativo da matriz extracelular intersticial. Esses processos promovem diminuição da superfície capilar glomerular funcional, acarretando hipoperfusão renal e redução da TFG, que muitas vezes permanece subclínica até o acometimento de >70% da função renal.

Mecanismos compensatórios e limiares de insuficiência renal

Com a perda progressiva dos néfrons, os remanescentes apresentam hipertrofia e hipermetabolismo para manter a função excretora, resultando em hiperfiltração que pode acelerar a lesão renal. Clinicamente, o aumento dos níveis séricos de creatinina, sódio e desequilíbrios ácido-base são indicativos da falência destas reservas funcionais. Gatos idosos podem manter valor de creatinina dentro do limite normal, porém apresentam declínio compensatório na TFG, dificultando diagnóstico precoce por meio de marcadores tradicionais.

Marcadores laboratoriais para avaliação da função renal em gatos geriátricos

Para um diagnóstico laboratorial preciso da função renal em felinos idosos, utilizam-se vários marcadores bioquímicos, hematológicos e urinários que refletem o estado das unidades funcionais renais na prática clínica.

Creatinina plasmática e sua interpretação clínica

A creatinina é o principal marcador endógeno tradicional para estimar a função renal. Em gatos geriátricos, a elevação acima de 1,6 mg/dL sugere redução significativa da TFG, porém deve-se considerar que creatinina é sensível a fatores como massa muscular e hidratação do paciente. Valores normais não excluem insuficiência renal em fases iniciais.

Ureia como marcador complementar

A ureia sanguínea é produto final do metabolismo proteico, eliminada exclusivamente pela filtração glomerular. Concentrações elevadas (>60 mg/dL) indicam redução da depuração renal e/ou aumento da produção endógena, mas seu valor isolado é limitado pela influência de fatores extrarrenais (estado nutricional, hemorragias gastrointestinais).

Clearance de creatinina e estimativa da taxa de filtração glomerular

A coleta de urina para estimativa do clearance de creatinina oferece uma avaliação da TFG mais acurada. Valores normais em gatos geralmente variam entre 1,0 a 2,5 mL/min/kg. Diminuição significativa expressa lesão renal crônica, sendo fundamental para o estadiamento da DRC segundo diretrizes internacionais (IRIS).

Marcadores emergentes: SDMA e proteinúria

O SDMA (dimetilarginina simétrica) representa um biomarcador sensível para redução precoce da função renal, elevando-se antes do aumento da creatinina sérica. Valores acima de 14 μg/dL indicam redução da TFG. A proteinúria, avaliada pelo Índice proteína/creatinina urinário (UPC), indica lesão glomerular consequentemente associada a pior prognóstico e progressão renal.

Aspectos clínicos e laboratoriais da Doença Renal Crônica (DRC) em gatos geriátricos

A DRC é caracterizada pela perda progressiva e irreversível da função renal, com manifestações clínicas variando conforme o estadiamento da doença. O diagnóstico laboratoriais embasa decisões clínicas, incluindo recomendações dietéticas, manejo da hipertensão e monitoramento farmacológico.

Estadiamento da DRC pelo sistema IRIS

O estadiamento baseado em creatinina sérica ajustada para condição Gold Lab Vet monitoramento clínica e pressão arterial é padrão internacional. Está dividido em estágios 1 a 4 com pontos de corte em creatinina iniciando em 1,6 mg/dL. Auxilia no prognóstico e planejamento terapêutico.

Alterações urinárias típicas da DRC

Há redução concentrativa tubular refletida pela baixa densidade urinária ( 1015), proteinúria de origem glomerular, e possível hematuria por processos inflamatórios concomitantes. A avaliação quantitativa da densidade e sedimentoscopia urinal fornecem informações complementares para rastreamento e monitoramento da doença.

Influencia da disfunção renal em parâmetros bioquímicos e eletrolíticos em gatos idosos

Alterações do metabolismo hidroeletrolítico e ácido-base são comuns em felinos geriátricos com disfunção renal, refletindo não apenas a incapacidade de excreção de solutos, mas também a progressão da lesão tubular.

Distúrbios acidobásicos e eletrolíticos

É frequente a ocorrência de acidose metabólica devido à diminuição da capacidade tubular de secreção de íons hidrogênio e reabsorção de bicarbonato. Hipocalemia e hipofosfatemia podem estar associadas ao mau estado nutricional e alterações hormonais. O monitoramento desses parâmetros permite ajustes terapêuticos essenciais para a estabilidade clínica do paciente.

Alterações no metabolismo do cálcio e do fósforo

A desregulação do eixo cálcio-fósforo com hipercalcemia secundária à diminuição da excreção fosfática e produção deficiente de calcitriol renal contribuem para nefrocalcinoses e complicações renais estruturais. Valores séricos de fósforo superiores a 5 mg/dL são prognósticos negativos e indicam necessidade de intervenção dietética e farmacológica.

Protocolos laboratoriais para avaliação detalhada da função renal em gatos geriátricos

A integração de exames hematológicos, bioquímicos e urinários configura a base para um diagnóstico preciso e completo da função renal e do estádio clínico em pacientes idosos.

Coleta e manuseio de amostras para avaliação renal

A coleta sanguínea deve ser realizada preferencialmente em jejum para evitar interferência de proteínas e metabolitos exógenos. Amostras de urina são obtidas por cystocentese para reduzir riscos de contaminação, prezando pela análise imediata ou manutenção refrigerada para minimizar alterações analíticas.

Interpretação integrada dos resultados laboratoriais

A interpretação deve ser orientada pela combinação dos valores de creatinina, ureia, SDMA, eletrólitos séricos, densidade urinária e proteinúria. A dissociação entre marcadores pode indicar diferentes graus ou tipos de lesão renal (glomerular versus tubular), coeficientes de compensação e presença de processos concomitantes.

Considerações finais e implicações clínicas para o manejo da função renal em gatos geriátricos

A avaliação da função renal em gatos geriátricos exige um protocolo laboratorial amplamente abrangente e uma interpretação clínica baseada no conhecimento fisiopatológico da nefropatia felina. O uso combinado de marcadores tradicionais e emergentes permite diagnóstico precoce, estadiamento adequado e monitoramento eficaz da progressão da DRC.

Considerações clínicas essenciais incluem a vigilância contínua da TFG estimada, monitoramento da proteinúria e controle dos distúrbios eletrolíticos e acidobásicos. O reconhecimento precoce das alterações laboratoriais possibilita intervenções nutricionais, farmacológicas e de suporte que retardam a progressão da insuficiência renal e melhoram qualidade de vida do paciente idoso.

O entendimento profundo das variações bioquímicas e da interação fisiopatológica renal em gatos geriátricos deve respaldar todas as decisões clínicas para otimização do diagnóstico laboratorial e da conduta terapêutica, consolidando o papel do patologista clínico veterinário como elemento chave no manejo multidisciplinar do paciente felino idoso.